quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

Apontamento nr.261




Vegetal e só



É outono, desprende-te de mim.


Solta-me os cabelos, potros indomáveis


Sem nenhuma melancolia,


Sem encontros marcados,


Sem cartas a responder.


Deixa-me o braço direito


O mais ardente dos meus braços,


O mais azul


O mais feito para voar.


Devolve-me o rosto de um verão


Sem a febre de tantos lábios,


Sem nenhum rumor de lágrimas


Nas pálperas acessas.


Deixa-me só, vegetal e só,


Correndo como rio de folhas


Para a noite onde a mais bela aventura


Se escreve exactamente sem nenhuma letra.



Eugénio de Andrade (1923 - 2005)"
As palavras Interditas", 1951

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